Celebramos meio século do momento mais belo da nossa História. Foi necessário muita coragem, resiliência e resistência para que o 25 de Abril de 1974 chegasse. Tombaram muitos em nome de uma liberdade que em 2024 parece estar ameaçada. Infelizmente, esta crónica é mais sobre isso do que sobre as conquistas tão relevantes, nomeadamente para as mulheres.
50 anos da Revolução. Informar, consciencializar e educar. Não podemos voltar para trás!
![50 anos da Revolução. Informar, consciencializar e educar. Não podemos voltar para trás!](https://setejornal.pt/wp-content/uploads/2024/04/ElsaMoura.jpg)
Cinquenta anos de liberdade em Portugal. Cinquenta anos de evolução, mesmo que nem sempre ao ritmo certo. Escrever sobre liberdade é fácil para quem nunca conheceu outra realidade.
Nasci em 1988 com televisão a cores, comida na mesa, conforto e segurança, no seio de uma família que sempre me apoiou, me escutou e me respeitou. Nasci precisamente num hospital público e fiz todo o meu percurso académico no ensino público. Educação e saúde são apenas dois exemplos das conquistas de Abril que hoje alguns colocam em causa, mas que continuarei a defender.
Sou jornalista, diretora de informação de um órgão de comunicação social desde os 30 anos, mulher e mãe (coisa ainda rara nas nossas empresas e na nossa imprensa).
Quem seria hoje a Elsa Moura se Portugal tivesse vivido mais tempo numa ditadura? Talvez até o meu último nome fosse diferente, já que seria propriedade do meu marido. Talvez não assumisse as responsabilidades que assumo e que muitas vezes me obrigam a não estar para jantar, a passar vários dias fora do lar por força da minha profissão, deixando o marido sozinho a assumir todas as tarefas.
Algum dia aqueles heróis de Abril imaginariam que 50 anos depois teríamos 50 deputados da extrema direita sentados no Parlamento? Pois! Dececionante e preocupante. E é por isso que os motivos pelos quais tivemos Abril precisam ser bem explicados nas salas de aula, em casa, no café ou no parque. É preciso esclarecer o que está em causa quando votamos em projetos com ideais tão retrógradas.
Reclamei, reclamo e reclamarei. Falei e continuarei a falar num país livre, na certeza também que não deixarei de exigir o progresso, um Portugal aberto a todos e a todas, que defende a igualdade de género, que condena a discriminação em todas as suas formas, que reprova a xenofobia. Um país que aceita a diferença, que promove a paz.
Temos a geração mais qualificada de sempre, mas algo está a falhar.
É uma urgência sensibilizar os eleitores dos próximos tempos e travar estes políticos de Tik Tok que usam truques para enganar criancinhas. É tempo de sair à rua e levantar o cravo vermelho com orgulho. Porque eu não deixarei que o meu filho cresça num país governado por fascistas que nos retiram direitos. Porque eu não compreenderei que o meu filho seja obrigado a cumprir serviço militar ou que não possa casar com um homem se assim o desejar. Porque eu não viverei num país que não respeita a liberdade do outro, que não se abre ao mundo.
Deixemo-nos de sensacionalismos. Podemos ler, ver documentários e filmes, assistir a palestras e tertúlias, ouvir programas dedicados à efeméride e que recordam, na primeira pessoa, tantos acontecimentos que antecederam a liberdade que hoje conhecemos, desde sobreviventes da Guerra Colonial, a cidadãos que lutaram pelo dia que provocou sentimentos inexplicáveis. Cidadãos comuns que arriscaram a vida, que lutaram às escondidas, que foram interrogados e torturados pela PIDE.
Depois de 10 de março, por sinal, dia das últimas eleições legislativas, assistimos recorrentemente a artigos de opinião, a intervenções em programas televisivos e radiofónicos e, até mesmo, na apresentação de livros, a uma enxurrada de sinais de quem parece não conviver bem com o progresso, com a igualdade de direitos, com as conquistas da mulher enquanto ser independente, que se pode dedicar a uma carreira profissional de sucesso, que não fica em casa a tomar conta dos filhos, da casa e da roupa do marido.
Há quem apregoe isto sem pingo de vergonha. Porque sim, esta gente também tem direito a um microfone à frente para dizer barbaridades. (Talvez até seja melhor que fiquem bem identificados, que saibamos quem são e onde estão).
Não passarão. Sairei para as ruas quantas vezes for necessário para defender Abril!
*Directora de informação da Rádio Universitária do Minho (RUM)
Foto: ©DR